É público e notório que a sociedade atual vive um momento atípico em sua história. Tal situação foi normatizada pelo direito pátrio no Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e na Lei nª 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que reconhecem o estado de calamidade pública e a emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19).
No que toca as medidas de saúde para diminuição do contágio desenfreado da Covid-19, o mundo inteiro tem adotado a prática de isolamento social - o que afeta diretamente as atividades empresariais, eis que somente as
consideradas essenciais pelo Poder Público possuem funcionamento autorizado, o que acaba por afetar o desenvolvimento da economia e relações trabalhistas. Neste sentido, o momento excepcional demanda adoção de medidas atípicas pelo Poder Público para enfrentamento da pandemia e mitigação dos impactos econômicos que dela se originam, sendo editadas, para tanto, normas legais específicas.
Em especial quanto à seara trabalhista e as relações laborais daí decorrentes, a Medida Provisória 936 trouxe importantes disposições que poderão ser utilizadas nesse momento de instabilidade econômica.
Em resumo, a MP 936 trata de três temas centrais, a seguir abordados:
I - Redução proporcional de jornada de trabalho e salário;
II - Suspensão temporária do contrato de trabalho;
III - Pagamento de benefício emergencial de manutenção do emprego e da renda, inclusive, em decorrência da redução de salários e suspensões de contratos de trabalho.
Benefício emergencial de manutenção do emprego e da renda
O benefício emergencial criado pelo artigo 5º da MP 936 consiste em uma parcela mensal custeada pela União Federal aos empregados quando da pactuação da redução proporcional de jornada e salário ou suspensão temporária contratual.
Cumpre esclarecer que tal Benefício será de prestação mensal e é devido a partir da data do início da redução da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, observadas as disposições previstas na MP, como a obrigação de o empregador informar ao Ministério da Economia a redução da jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho, no prazo de dez dias, contado da data da celebração do acordo; dentre outras. É certo que o Empregador está sujeito a algumas penalidades estipuladas na Medida Provisória caso não obedeça às formalidades descritas na MP.
Demais disso, o Benefício tem como base de cálculo o valor mensal do seguro-desemprego a que o empregado teria direito, variando-se a sistemática conforme a opção de redução de jornada de trabalho e de salário ou na hipótese de suspensão temporária do contrato de trabalho – conforme será esclarecido nos itens seguintes.
Portanto, trata-se de verdadeiro subsídio arcado com recursos públicos para quitação ou complementação salarial dos trabalhadores nesse momento de crise.
Redução proporcional de jornada de trabalho e salário
Segundo a MP 936, empregado e empregador poderão acordar a redução proporcional da jornada de trabalho por até três meses, com diminuição do salário na mesma proporção.
De forma a mitigar a diminuição salarial do empregado, o governo arcará com o restante do salário até o teto do valor do seguro-desemprego a que o trabalhador teria direito caso fosse dispensado – conforme a sistemática do Benefício Emergencial.
Foram previstos três percentuais de redução de jornada e salário pelo artigo 7º, inciso III, da Medida Provisória 936: 25%; 50% e 70%.
A redução de jornada de trabalho e de salário de 25% poderá ser pactuada por acordo individual ou por acordo coletivo/ convenção coletiva, independentemente do valor mensal do salário.
Já nos casos de reduções de 50% ou 70%, apenas poderão ser efetivadas por acordo coletivo/ convenção coletiva nas situações em que o empregado tiver o salário compreendido entre R$ 3.135,01 e R$ 12.142.41, ou até se for o valor igual ou acima de R$ 12.212.42, mas sem nível superior de formação.
A redução de jornada deve preservar o valor do salário-hora de trabalho e está limitada a 90 dias.
Além disso, para validade da redução deve existir acordo individual escrito entre empregador e empregado, com proposta encaminhada ao empregado com antecedência mínima de dois dias corridos e estabilidade no emprego até o dobro do período de redução pactuado.
Suspensão temporária do contrato de trabalho
As empresas de pequeno porte cujo faturamento seja de até R$ 4,8 milhões por ano, poderão dispensar temporariamente os funcionários sem pagar nenhuma parte do salário. Neste caso o Poder Público arcaria com uma remuneração aos empregados equivalente a 100% do seguro-desemprego ao qual o trabalhador teria direito caso fosse dispensado.
Poderão ser realizadas negociações individuais entre empregadores e empregados quando a remuneração dos colaboradores seja de até três salários mínimos (R$ 3.135,00) ou no caso de trabalhador de nível superior que receba o dobro do teto da previdência social (R$ 12.202,12).
Caso os empregados não se enquadrem nas duas hipóteses acima, a suspensão contratual só poderá ser realizada por convenção ou acordo coletivo (art. 12. § único).
Para as empresas de maior porte (faturamento anual acima de R$ 4,8 milhões) a suspensão do contrato de trabalho também poderá ocorrer, contudo terão de arcar com 30% do salário de seus empregados. Os 70% restantes serão custeados pelo governo até o limite de 70% do valor do seguro desemprego a que o colaborador teria direito. Os tipos de empregados cuja suspensão contratual poderá ser efetivada por negociação individual são os mesmos das empresas de pequeno porte.
Caso as suspensões contratuais sejas efetuadas por negociações coletivas, aprovadas em assembleias virtuais pelos sindicatos da categoria, a suspensão com complementação de renda valerá para todos os empregados da empresa. Nesta hipótese, os empregados não precisarão dar entrada no seguro-desemprego, cabendo ao poder público depositar automaticamente o valor na conta do trabalhador assim que for notificado da negociação.
Será de 60 dias o prazo máximo da suspensão dos contratos com base na MP 936, sendo que no caso de acordos individuais o empregador deve enviar ao empregado a proposta com antecedência mínima de dois dias corridos. Deverão ser mantidos os benefícios pagos aos empregados durante o período de suspensão, como vale alimentação e auxílios, e o empregado não poderá ser requisitado para trabalho remoto ou a distância.
Pontos comuns entre a Redução de Jornada e Salário e Suspensão Contratual
A MP 936 prevê também estabilidade provisória do emprego durante o período de suspensão e após o restabelecimento da jornada por período equivalente ao da suspensão. Ou seja, uma suspensão de dois meses garante uma estabilidade de quatro meses no emprego.
A jornada de trabalho e o salário anteriormente pago serão restabelecidos quando houver a cessação do estado de calamidade pública, o encerramento do período pactuado no acordo individual ou pelo empregador no fim do período de redução.
Por fim, para que tais medidas sejam implementadas, deve haver a concordância tanto da parte empregadora quanto do empregado, obedecendo-se as formalidades e os requisitos descritos na MP.
ADI 6.363/ Supremo Tribunal Federal
Cumpre asseverar que em decisão cautelar proferida na data de 06/04/2020 pelo Ministro do STF, Ricardo Lewandowski, as empresas deverão notificar os sindicatos da intenção de suspender temporariamente contratos e de realizar cortes salariais com base na MP 936.
Assim, em que pese a cristalina estipulação pela MP 936 das hipóteses em que os acordos individuais poderão ser utilizados, nos termos da decisão cautelar da Suprema Corte e segundo as palavras do relator Ricardo Lewandowski, “os acordos individuais somente se convalidarão e surtirão efeitos após a manifestação do sindicato dos empregados”.
Conclusão
Por todo o exposto, sustenta-se que as disposições da MP 936/2020 podem ser aplicadas a várias empresas e empregadores – entretanto, considerando a especificidade legal e melhor aproveitamento da gestão de riscos trabalhistas/ empresariais, sua implementação dede ser efetivada com auxílio do profissional Advogado, eis que a análise dos cargos, funções, porte da empresa, dentre outros fatores, é fundamental para correta implementação dos dispositivos legais editados.
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